Segundo Stephen Porges, a melhor maneira de restaurar um sistema nervoso saudável e resiliente é estar rodeada de pessoas seguras, sintonizadas e presentes

O neurocientista americano Stephen Porges, profundo conhecedor do funcionamento do sistema nervoso humano, muito tem nos ensinado a este respeito de modo a tornar as nossas práticas clínicas diárias mais efetivas.

Ele nos fala a respeito dos traumas que os profissionais da área acompanham todos os dias em seus contatos online ou pelo atendimento tradicional, em seus consultórios, e que resultam no aumento da ansiedade, depressão, medo, tristeza, vulnerabilidade, insegurança, impotência, transtorno do estresse pós-traumático (TEPTS), entre outros.

Para Porges, tudo está relacionado à desregulação do nosso sistema nervoso, segundo a Teoria Polivagal criada por ele para explicar a reação fisiológica de nosso sistema nervoso ao perigo e que revolucionou os tratamentos de traumas no mundo.
Por isso, conhecer nosso sistema nervoso autônomo, ou SNA, é fundamental para entender o que está acontecendo conosco e ajudar as pessoas no seu processo terapêutico.

O SNA cuida de muitas funções automáticas do nosso corpo, como freqüência cardíaca, digestão e temperatura corporal etc… Ele também é responsável por nossa resposta à sobrevivência e ao estresse, trabalhando há bilhões de anos para nos manter vivos frente ao perigo.

Tudo acontece automaticamente, não pensamos para que isso ocorra. De acordo com Porges, o SNA examina constantemente o ambiente em busca de segurança e de perigo e pode nos levar a três respostas diferentes frente a essas situações:

Seguro – você se sente calmo, relaxado e conectado com as pessoas ao seu redor;
Mobilizado – quando detecta perigo, ele envia um comando e sua freqüência cardíaca e respiração aumenta, sendo liberados adrenalina e cortisol e o sangue corre para seus músculos para que você possa lutar ou fugir, lidar com a ameaça;
Imobilizado – quando o SNA detecta que o perigo é tão grande que você não consegue lutar ou fugir, ele desliga você. Nesse estado, nossos batimentos cardíacos, pressão sanguínea e temperatura corporal diminuem e endorfinas anestésicas são liberadas.

Quando o SNA funciona bem, ele nos ajuda a gerenciar e a nos tornarmos resilientes ao estresse e a eventos negativos. Conseguimos nos recuperar e seguir em frente.

Mas, o SNA pode se desregular quando vivenciamos um trauma ou traumas de apego ou mesmo estresse crônico. Ao vivenciar situações impactantes, o sistema de detecção do SNA pode apresentar falhas e apresentar perigo permanente, mesmo quando estamos seguros. E viver constantemente nessa situação, pode ser debilitante, levando o indivíduo a buscar “válvulas de escape”, como drogas, álcool, comida, trabalho ou sexo, buscando alívio à sua inquietação.

Muitas experiências podem ser traumatizantes e impactar negativamente o SNA, como acidentes, agressões, desafios naturais, estresse crônico, principalmente os vivenciados durante o desenvolvimento, situações de discriminação e violência, uma pandemia, entre outras.

Pesquisas mostram também que o trauma pode ser transmitido transgeracionalmente por pelo menos três gerações.

E o que podemos fazer para regular nosso Sistema Nervoso Autônomo? Como nos recuperar do trauma?

A melhor maneira de restaurar um SNA saudável e resiliente é relacionalmente – é estar rodeada de pessoas seguras, sintonizadas e presentes.

As psicoterapias clínicas são espaços relacionais saudáveis e as diferentes abordagens, além de colaborar no autoconhecimento e desenvolvimento, buscam restabelecer a segurança e regular o SNA.

E hoje já sabemos que muitas das atividades que intuitivamente nos trazem conforto, como estar na natureza, praticar ioga, dança, meditar, ajudar os outros, entre outras, ajudam o SNA a se tornar mais regulado. Isso não significa estar calmo o tempo todo. Isso significa ter um sistema nervoso flexível, resiliente e podermos nos mover com fluidez de um estado para outro, tendo uma vida mais saudável e segura.

Nosso aparato nervoso tem experiência de bilhões de anos e nossas vivências adversas podem ser integradas em forma de aprendizado, trazendo-nos maior capacidade de adaptação, maturidade e sabedoria.

Texto escrito por Sandra Colaiori
Psicologa Clínica e Psicoterapeuta

Tags: /